Andando por Portugal, descobri coisas comuns, como já
houvera descoberto de outras vezes, coisas de lá que temos também aqui no
Brasil. Afinal, Florianópolis, São Francisco, Laguna e outras cidades são de
colonização açoriana. Comi, em Lisboa, a tradicional sardinha assada e vi como
se faz a açorda. Eu ouvia minha vó pequena falar da tal açorda, mas a impressão
que eu tinha era de ouvir ela dizer “sôlda”, assim, com o som do “o” fechado.
Esse foi mais um ponto de convergência, de identificação de
coisas de Portugal com as coisas daqui. Lembro que minha avó Estefânia, a “vó
pequeninha”, fazia a açorda parecida com a que se faz em Portugal. E é bom
lembrar da infância, lembrar da minha avó pequeninha, aquela criatura magnífica.
Ela colocava água numa panela, colocava sal e temperos verdes e, por fim,
colocava algumas sardinhas. Assim que a água fervia, ela tirava as sardinhas,
separava e quebrava dois ou três ovos no caldo, conforme quantas pessoas fossem
comer. Tirava os ovos tipo pochê da panela, colocava caldo em um prato e
acrescentava pão em pedaços ou farinha de mandioca. Então servia uma sardinha e
um ovo por cima de tudo e servia. É bom frisar que o pão rasgado em nacos é
condição sine qua non na açorda.
Vó pequeninha adorava este prato e se deliciava com ele.
Pois a açorda feita em Portugal não é muito diferente, a não ser pela farinha
de mandioca, que minha avó usava em Corupá e em Portugal não se coloca nesse
prato – o peixe, que ao invés de sardinha é bacalhau – pequena diferença, não
é? – e o tempero verde que lá é coentro, que eu nem conhecia e só agora, recentemente,
descobri que detesto. É que em alguns lugares de Portugal fui servido com
bacalhau temperado generosamente com coentro e quase não conseguir comer.
Não sei se hoje em dia o prato ainda é conhecido por aqui,
mas para quem não conhece, vale a pena experimentar. Podemos usar um peixe
daqui ou o bacalhau, como em Portugal e até temperar com o coentro, que já é
apreciado também por aqui.
Para mim, foi muito bom relembrar a açorda, pois lembrei
também da minha vó pequeninha, aquela mulher realmente pequeninha, que nem
sequer sabia ler e escrever, mas era uma pessoa verdadeiramente sábia. Ela
morava para além do cemitério de Corupá
e ia de sua casa até a igreja, quase todos os dias, cantarolando. Grande parte
do caminho não tinha iluminação e ela passava, inclusive, por dentro do cemitério.
E lá ia ela, sempre cantando. Toda a
cidade a conhecia pela sua cantoria, que revelava serenidade e paz de espírito.
A açorda me trouxe à memória a lembrança de minha avó,
pessoa das mais marcantes e da qual nunca vou esquecer.
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