Por Luiz Carlos Amorim - Escritor - http://www.prosapoesiaecia.xpg.com.br/
Minie chegou em nossa casa e entrou em nossas vidas quando minhas filhas ainda eram pequenas. Ela também tinha apenas poucos meses e tornou-se parte da família. Era pequena, muito pequena, e cresceu pouco. Era dourada e seu pelo escurecia, ficava mais marron no inverno, quando lhe colocávamos vestido para não passar frio, pois pinscher é uma raça muito sensível a temperaturas um pouco mais baixas.
Tinha medo de trovoada e do espoucar de fogos, mas não hostilizava ninguém: adorava que lhe fizessem carinho e se aproximava de quem quer que seja abanando o rabinho que lhe fora cortado muito rente. Latia apenas quando passavam estranhos na calçada ou batiam palmas no portão. Ou latia para outro cão.
Sabia pedir carinho: aproximava-se, colocava a cabeça debaixo da mão da gente, insistindo para que a acariciássemos. Sabia como fazer para que passássemos a mão em sua cabeça.
Quando fez dois anos, levamos Minie para cruzar com um cão da mesma raça. Na volta, um visitante, ao entrar em nossa casa, deixou o portão aberto e ela saiu para a rua. Quando percebemos, ela estava grudada com o cão do vizinho, um vira-latas simpático. Então nasceram os filhotes, de pais diferentes: o Menino, filho do pinscher e uma menina, mestiça, filha do vira-latas. O menino tinha porte, era um pinscher puro, de pernas compridas, focinho longo, pelo preto. A menina, Pitucha, hoje Xuxu, por corruptela, não tinha as pernas tão longas e o focinho era mais curto, mas as orelhas eram grandes e alertas. E era linda. Aliás, é linda. Não é tão simpática como a mãe, late por qualquer coisa e ameaça morder quem tentasse lhe encostar a mão. Mas só ameaça, nunca mordeu ninguém.
O Menino, nós demos de presente para minha irmã. Viveu pouco, alguém o envenenou. Pitucha está viva, com seus doze anos, saudável, mas atualmente anda quieta pelos cantos, com saudade da mãe.
Minie – a nossa “Dona Menina” - não era mais tão forte, pois sua idade, já um tanto avançada, evidenciava que não tardaria muito o dia em que a perderíamos. No entanto, esperávamos que vivesse mais. Um problema em uma das patas traseiras – talvez reumatismo ou artrite – fazia com que andasse com dificuldade, às vezes, principalmente em dias de tempo ruim. Tinha também um tumor nas mamas e ainda bem que não a levamos para operar – ameaçamos várias vezes, mas o veterinário não tinha certeza se seria o mais indicado – ela não resistiria.
Quando entrava no cio, destruía o que encontrasse pela frente: primeiro a sua cesta, depois tapetes, mantas, lençóis, travesseiros, o que estivesse ao seu alcance.
Depois da meia idade, em passando o cio, contraía o que chamam de gravidez psicológica: ela achava que tinha um filhote, suas tetas enchiam-se de leite, que ela mesma bebia, pois os brinquedos que adotava como filhos – uma bola, um bichinho de plástico – não consumiam o leite que produzia.
Moramos alguns anos em apartamento, mas não nos desfizemos das duas. Aprenderam a fazer xixi e cocô no banheiro, quando não podíamos sair com elas para a rua.
Voltamos a morar em uma casa, meses antes de Minie ir-se. Assim, ela teve mais espaço para andar e se exercitar, por algum tempo.
Acho que ela teve uma boa vida. Mas o que me impressionou mesmo foi a maneira como se foi. Eu já tinha ouvido falar que os cães sabem quando a sua hora está próxima e procuram um lugar escondido para morrerem. No entanto, não imaginava o quão verdadeiro isso era. No dia anterior a sua morte, ela parecia estar doente. Demos-lhe o remédio que o veterinário indicara, mas não adiantou. Ficava deitada pelos cantos, só lá de vez em quando dava o ar da sua graça. A primeira coisa que chamou nossa atenção, foi que deixou Gabriel, meu sobrinho de um ano, passar a mão nela, sem brigar com ele. Deitou no chão, ficou de barriga para cima e deixou ele acariciá-la. Lembram-se que eu disse que ela aceitava carinho de qualquer pessoa, fosse estranho ou não? Pois é. Faltou dizer que só não gostava de guri pequeno, pois apertavam-na, beliscavam, batiam. Então ela não gostava de criança e ameaçava morder, se eles insistissem. Mas naquele dia, só naquele dia, deixou que o pequeno Gabriel passasse a mão na sua cabeça, na sua barriga, nas suas costas.
Nos últimos tempos ela dormia no quarto de minha filha. Na última noite, porém, ela dormiu debaixo da nossa cama. Logo que abrimos a porta, bem cedo, ela saiu e foi para fora. Não temos gramado, apenas um pequeno, muito pequeno jardim na parte da frente da casa, rodeado de brita. Já era assim quando compramos a casa, apenas fizemos o jardim, para plantar algumas flores, algum tempero e uma hortelã, um ou outro chá. Pois Minie foi para lá e começou a cavar primeiro em volta de um pé de manjericão – mas não dava para se esconder debaixo dele – então tentou cavar em volta de uma touça de outra flor, mas chegou a arrancar quase toda a planta, cavou fundo e também não conseguiu um lugar para se isolar. Levou uma bronca de minha esposa, e voltou para dentro de casa, para debaixo da cama. Fui lá vê-la e peguei-a no colo. Fiquei assustado, pois ela estava muito mole, os olhos marejados, parados, não ficava mais sobre as patas.
Levamos “Dona Menina” rapidamente ao veterinário, mas quando chegamos lá ele nos disse que ela estava morrendo. Já estava morrendo antes mesmo de a levarmos.
Foi muito triste ver “Dona Menina” ir-se. Vimos os últimos espasmos dela. Apesar de o veterinário garantir que ela não sofreu, que aqueles últimos espasmos eram mais reflexos musculares do que outra coisa, porque ela não estaria mais ali, foi muito doído.
Se existe um céu para cães, espero que ela esteja lá. Aqui ela faz uma falta imensa, pois fazia parte da família. Não imagino como será quando Pitucha – a nossa Xuxu – se for. Mas é melhor não pensar nisso.
Minie chegou em nossa casa e entrou em nossas vidas quando minhas filhas ainda eram pequenas. Ela também tinha apenas poucos meses e tornou-se parte da família. Era pequena, muito pequena, e cresceu pouco. Era dourada e seu pelo escurecia, ficava mais marron no inverno, quando lhe colocávamos vestido para não passar frio, pois pinscher é uma raça muito sensível a temperaturas um pouco mais baixas.
Tinha medo de trovoada e do espoucar de fogos, mas não hostilizava ninguém: adorava que lhe fizessem carinho e se aproximava de quem quer que seja abanando o rabinho que lhe fora cortado muito rente. Latia apenas quando passavam estranhos na calçada ou batiam palmas no portão. Ou latia para outro cão.
Sabia pedir carinho: aproximava-se, colocava a cabeça debaixo da mão da gente, insistindo para que a acariciássemos. Sabia como fazer para que passássemos a mão em sua cabeça.
Quando fez dois anos, levamos Minie para cruzar com um cão da mesma raça. Na volta, um visitante, ao entrar em nossa casa, deixou o portão aberto e ela saiu para a rua. Quando percebemos, ela estava grudada com o cão do vizinho, um vira-latas simpático. Então nasceram os filhotes, de pais diferentes: o Menino, filho do pinscher e uma menina, mestiça, filha do vira-latas. O menino tinha porte, era um pinscher puro, de pernas compridas, focinho longo, pelo preto. A menina, Pitucha, hoje Xuxu, por corruptela, não tinha as pernas tão longas e o focinho era mais curto, mas as orelhas eram grandes e alertas. E era linda. Aliás, é linda. Não é tão simpática como a mãe, late por qualquer coisa e ameaça morder quem tentasse lhe encostar a mão. Mas só ameaça, nunca mordeu ninguém.
O Menino, nós demos de presente para minha irmã. Viveu pouco, alguém o envenenou. Pitucha está viva, com seus doze anos, saudável, mas atualmente anda quieta pelos cantos, com saudade da mãe.
Minie – a nossa “Dona Menina” - não era mais tão forte, pois sua idade, já um tanto avançada, evidenciava que não tardaria muito o dia em que a perderíamos. No entanto, esperávamos que vivesse mais. Um problema em uma das patas traseiras – talvez reumatismo ou artrite – fazia com que andasse com dificuldade, às vezes, principalmente em dias de tempo ruim. Tinha também um tumor nas mamas e ainda bem que não a levamos para operar – ameaçamos várias vezes, mas o veterinário não tinha certeza se seria o mais indicado – ela não resistiria.
Quando entrava no cio, destruía o que encontrasse pela frente: primeiro a sua cesta, depois tapetes, mantas, lençóis, travesseiros, o que estivesse ao seu alcance.
Depois da meia idade, em passando o cio, contraía o que chamam de gravidez psicológica: ela achava que tinha um filhote, suas tetas enchiam-se de leite, que ela mesma bebia, pois os brinquedos que adotava como filhos – uma bola, um bichinho de plástico – não consumiam o leite que produzia.
Moramos alguns anos em apartamento, mas não nos desfizemos das duas. Aprenderam a fazer xixi e cocô no banheiro, quando não podíamos sair com elas para a rua.
Voltamos a morar em uma casa, meses antes de Minie ir-se. Assim, ela teve mais espaço para andar e se exercitar, por algum tempo.
Acho que ela teve uma boa vida. Mas o que me impressionou mesmo foi a maneira como se foi. Eu já tinha ouvido falar que os cães sabem quando a sua hora está próxima e procuram um lugar escondido para morrerem. No entanto, não imaginava o quão verdadeiro isso era. No dia anterior a sua morte, ela parecia estar doente. Demos-lhe o remédio que o veterinário indicara, mas não adiantou. Ficava deitada pelos cantos, só lá de vez em quando dava o ar da sua graça. A primeira coisa que chamou nossa atenção, foi que deixou Gabriel, meu sobrinho de um ano, passar a mão nela, sem brigar com ele. Deitou no chão, ficou de barriga para cima e deixou ele acariciá-la. Lembram-se que eu disse que ela aceitava carinho de qualquer pessoa, fosse estranho ou não? Pois é. Faltou dizer que só não gostava de guri pequeno, pois apertavam-na, beliscavam, batiam. Então ela não gostava de criança e ameaçava morder, se eles insistissem. Mas naquele dia, só naquele dia, deixou que o pequeno Gabriel passasse a mão na sua cabeça, na sua barriga, nas suas costas.
Nos últimos tempos ela dormia no quarto de minha filha. Na última noite, porém, ela dormiu debaixo da nossa cama. Logo que abrimos a porta, bem cedo, ela saiu e foi para fora. Não temos gramado, apenas um pequeno, muito pequeno jardim na parte da frente da casa, rodeado de brita. Já era assim quando compramos a casa, apenas fizemos o jardim, para plantar algumas flores, algum tempero e uma hortelã, um ou outro chá. Pois Minie foi para lá e começou a cavar primeiro em volta de um pé de manjericão – mas não dava para se esconder debaixo dele – então tentou cavar em volta de uma touça de outra flor, mas chegou a arrancar quase toda a planta, cavou fundo e também não conseguiu um lugar para se isolar. Levou uma bronca de minha esposa, e voltou para dentro de casa, para debaixo da cama. Fui lá vê-la e peguei-a no colo. Fiquei assustado, pois ela estava muito mole, os olhos marejados, parados, não ficava mais sobre as patas.
Levamos “Dona Menina” rapidamente ao veterinário, mas quando chegamos lá ele nos disse que ela estava morrendo. Já estava morrendo antes mesmo de a levarmos.
Foi muito triste ver “Dona Menina” ir-se. Vimos os últimos espasmos dela. Apesar de o veterinário garantir que ela não sofreu, que aqueles últimos espasmos eram mais reflexos musculares do que outra coisa, porque ela não estaria mais ali, foi muito doído.
Se existe um céu para cães, espero que ela esteja lá. Aqui ela faz uma falta imensa, pois fazia parte da família. Não imagino como será quando Pitucha – a nossa Xuxu – se for. Mas é melhor não pensar nisso.
Ahhh Amorim que tristeza...Na minha adolescência tivemos um pinscher tb, Kiko, que morreu atropelado... Tamanha a minha tristeza disse que "nunca mais quero outro cão"! Não comprei quando meus filhos eram pequenos e há quatro anos não resisti, a uma bolinha branca, da raça poodle, que por aqui chegou nas mãos de minha filha! Max, meu "neto" de quatro patas é alegria da casa... Mas, numa negação mais que consciente rsrs, não gosto de pensar quando sua hora chegar! Quando assisti ao filme Marley e eu e as lágrimas descendo soltas, só dizia pros meninos: Tá vendo o que vcs me arrumaram? Olha o que me aguarda! No que meu filho mais velho respondeu: Mãe não tô te entendendo! Vc não nos ensina que não há ganho sem perda e perda sem ganho? Que é essa a mágica da vida?
ResponderExcluirQuem mandou eu ser falante assim,né? Vou então usufruindo, todos os dias, do meu Max Amado!
Beijuuss n.c.
Regina
www.toforatodentro.blogspot.com
Olá,Luís Carlos Amorim tenho 9 anos sou eu que vou com ajuda de meus colegas homenagea-ió no Colégio São Paulo.Achei suas crônicas muito interessantes percebi o sentimento de tristesa e dor .Só no último dia de sua vida DONA MENINA deixou seu neto acaricia-lá.
ResponderExcluirSOU UMA GRANDE ADMIRADORA DE SEU TRABALHO.
Outros trabalhos:
Flecha Dourada
Borboletas nos Jacatirões
Nação Poesia
e etc...
MARIA EDUARDA ROEDEL 5 ANO